terça-feira, 10 de julho de 2012

Os 40 anos do VII Festival Internacional da Canção








Onde tudo começou

Um dos Festivais mais importantes na década de 70 foi o VII FIC - Festival Internacional da Canção , realizado no Maracanazinho, Rio de Janeiro no segundo semestre de 1972. Este que foi o último dos grandes festivais de MPB foi palco para revelação de grandes nomes da música brasileira como Ednardo, Fagner, Belchior, Alceu Valença, Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Hermeto Pascoal, Raul Seixas, Renato Teixeira, Sirlan, Paulo César Pinheiro, Rildo Hora, Ruy Mauriti, entre muitos outros compositores e intérpretes, que se somaram aos já s conhecidos Jackson do Pandeiro, Marlene, Os Mutantes (Rita Lee / Arnaldo / Sérgio / Liminha)e Jorge Ben que fez grande suscesso neste festival antes de ser "descoberto" pelos tropicalistas.


 Novos talentos: Fagner, Maria Alcina e Belchior

O VII FIC aconteceu no período mais duro da Ditadura Militar que foi o período Médici. Em plena vigência do AI-5 , Ato Institucional número 5, decretado em dezembro de 1968, que institucionalizava a tortura, o que ainda existia de liberdade de expressão, principalmente na cultura, foi definitivamente sufocada e duramente reprimida. Com o fim dos direitos individuais, as prisões e torturas, não só de quem lutava contra a ditadura, mas a toda e qualquer tipo de crítica ao status quo, tornou-se generalizada em todo o país. Artistas como Caetano e Gil foram presos e expulsos do país, outros se auto exilaram por algum tempo como Chico Buarque e Raul Seixas.


Conforme estudo  de Carvalho  sobre os festivais,
"...Ao falarmos das diversas críticas que dizem respeito aos FICs, percebermos que sejam quais forem os pontos fracos ou fortes deste festival, eles estão em sintonia com a realidade sociocultural e política da época. O FIC de 1972 traz,
de fato, diversas revelações musicais para o cenário artístico, apesar de desde 1968 começar o esvaziamento cultural que ocorreu no Brasil em conseqüência da repressão da ditadura implantada quatro anos antes, causando um efeito devastador na criatividade musical brasileira, cada vez mais refém da censura"
 ( Carvalho, Felipe, In FIC maravilha nos gostamos de você:Música e festivais em tempos de chumbo(1972) TTC de Licenciatura em história, Universidade do Paraná, 2008).
O VII FIC foi um exemplo claro de como atuava o aparelho repressivo. A começar pela destituição sumária de todo o Juri Nacional do Festival , incluindo espancamento do psicanalista Roberto Freire, jurado destituído que  queria ler uma nota de explicação e repúdio à arbitrariedade. Faziam parte do juri com Freire, César Camargo Mariano, Julio Medaglia,  Décio Pignatari e Sérgio Cabral. Esses três últimos viriam participar também do júri, juntamente com Mário Luís Barbato, Rogério Duprat, Alberto de Carvalho, João Carlos Martins, Guilherme Araújo, Big Boy e Walter Silva.

 Segundo depoimento de Solano Ribeiro,  organizador do VII FIC/72 publicado no blog http://weloverocknrollprincipal.blogspot.com.br,  Nara Leão, que  era a presidente do Juri  tinha dado uma entrevista ao Jornal do Brasil falando muito mal dos militares, e acabou sendo o argumento usado pelos militares para a destituição de todo o juri. Conforme conta Solano "como o Boni dava total carta branca, eu coloquei a Nara como presidente do Júri. Fizemos as eliminatórias e quando chegou a final, veio uma ordem da TV Globo: 'a Nara não pode mais participar do festival'. Eu falei: 'mas como? Agora? Falta só a final, aconteceram as eliminatórias'. Eles bateram o pé: 'Não, não pode. É ordem do Dr. Roberto.'Eu fiquei bestificado. 'Mas peraí, nós estamos recuperando o nome do festival, nós estamos recuperando a credibilidade, agora vocês vão jogar isso tudo no lixo'. Eles foram firmes: 'Não tem discussão, isso veio uma ordem de algum escalão militar lá, ela não pode mais aparecer'
 Um novo júri composto por "especialistas estrangeiros" selecionou duas músicas para a competição internacional, gerando uma série de protestos e pancadaria.

Sirlan apresenta sua "Zapátria", mais um grande compositor que surgiu no FIC e  que foi esquecido.


Na final nacional, Roberto Freire, ao tentar ler um manifesto representando o júri expurgado, foi arrastado do palco e brutalmente espancado. No manifesto, depois lido pelo apresentador Murilo Néri, defendia-se a escolha de "Cabeça", de Walter Franco, e "Nó na Cana", de Ari do Cavaco e César Augusto.
As canções vencedoras foram "Fio Maravilha", composição de Jorge Ben defendida por Maria Alcina, e "Diálogo", samba de Baden Powel e Paulo César Pinheiro, interpretado por Cláudia Regina e Baden. Nenhuma das composições brasileiras saiu vitoriosa na fase internacional.
 Foi neste festival que a música de Sérgio Sampaio "Vou botar o meu bloco na rua" estourou como um grande sucesso de público, mesmo não sendo a vencedora, foi a música que lançou o compositor capixaba no cenário nacional.

O que pouco gente sabe é o que revela Carvalho em seu estudo, já citado, onde conta que  "na segunda eliminatória, no dia seguinte, o júri classificaria  sete canções. Embora o proposto eram de seis classificadas por eliminatória, o empate entre duas canções acabaram por incluir ambas e, aproveitando a deixa, o júri acrescentou, a pedido de Nara Leão, a melodia Eu quero e botar meu bloco na rua, de Sérgio Sampaio".

Sobre a música Sérgio Sampaio disse:  “Fiz a canção num momento de angústia bastante grande, eu sozinho comigo cantando, e sentia que ela tinha um poder. Depois, mostrei para Raul e ele mesmo disse: ‘Pomba, é isso aí, dá pé, esse negócio aí é legal’”.


 

Mesmo que este VII FIC tenha sido pela primeira vez, transmitido pela Rede Globo em cores para o Brasil e Exterior, suas imagens "desapareceram" e até hoje o único registro existente são os dois LPs lançados.

O único vídeo que existe com imagens do festival e disponibilizado em sites públicos como o You Tube é um pequeno trecho de Maria Alcina cantando "Fio Maravilha" de autoria de Jorge Ben.


Bem vindos ao blog Cada Lugar Na Sua Coisa: O blog dos Malditos


Cada Lugar Na Sua Coisa: O blog dos malditos


Um livro de poesia na gaveta não adianta nada
Lugar de poesia na calçada

( Trecho da música Cada Lugar na Sua coisa")


São muitos os "malditos" da música brasileira, carregam esse "rótulo" ou seria um "título"? artistas diversos como Jards Macalé, Jorge Mautner, Waly Salomão, Itamar Assumpção, Helio Oiticica, Luiz Melodia, Tom Zé , Belchior, entre outros... Mas nenhum foi tão "amaldiçoado" pela mídia e a "industria cultural" do que o capixaba Sérgio Sampaio. Passados 40 anos do antológico Festival Internacional da Canção de 1972, que o lançou ao sucesso com sua marcha-rancho "Eu vou botar o meu bloco na rua" , o mais "maldito" entre os "malditos" está sendo redescoberto, ou melhor poderíamos dizer descoberto, pois sua obra é ao mesmo tempo uma das mais ricas e mais desconhecidas da MPB. Alguns dizem que o motivo está em que a obra de Sampaio estava a frente do seu tempo e dificilmente teria espaço nos anos 80 e 90. Sampaio lançou apenas 3 discos, morreu em 1994, vitima de uma pancreatite, sem conseguir lançar seu quarto disco.

Inspirados pela vida e obra do "maldito" Sérgio Sampaio, que foi um grande músico brasileiro que, como muitos, foi esquecido, rotulado e marginalizado- talvez ele tenha pago o preço de ser, como ele mesmo se autodefinia, "apenas um compositor popular- criamos este blog com o objetivo de divulgar, debater e principalmente homenagear tod@s @s "maldit@s" da cultura e contracultura:   artistas, músicos, escritores, poetas que ficaram ou estão, por opção ou não, à margem da grande mídia.

Mesmo que seja compreensível a crítica que o próprio Sérgio fazia ao rótulo pejorativo que lhe deram, hoje é possível dizer que todos aqueles que foram tachados de "Malditos" ou "marginais" pela mídia, por não vestirem o figurino que a industria cultural exigia, são os artistas de maior talento e criatividade da MPB .

Portanto, ser "marginal" ou "maldito" adquire um  sentido de singularidade e originalidade, que é o do artista que não é enquadrado ou não quer se enquadrar nos grandes esquemas do mercado e da mídia de massas. que busca a independência para sua própria liberdade criativa.
Conforme o proprio Sampaio dizia em sua música "Sinceramente": 

Não há nada mais bonito do que ser independente
E poder se conquistar, sair, chegar, assim tão simplesmente. . .

Não há nada mais tranquilo do que ser o que se sente
E poder amar, perder, chorar, depois ganhar assim tão livremente


O blog é também uma homenagem à Sérgio Sampaio, sua obra terá presença constante neste blog. Escreveremos sobre suas composições, o contexto em que viveu e a continuidade de sua obra que permanece viva no trabalho de outros compositores e admiradores.

O blog se propõe também  a divulgar a obra de muitos outros "malditos" que , por coincidência ou não, são filhos do  VII Festival Internacional da Canção, realizado no Rio de Janeiro no segundo semestre de 1972. Este que foi o último dos grandes festivais de MPB,   cenário da estreia de grandes músicos e compositores geniais, que viriam a receber  rótulo de "Malditos" ou "Marginais", pois seguiram suas carreiras fora do eixo comercial das grande mídia; malditos como Raul Seixas, Sérgio Sampaio, Belchior, que compõe o universo dos geniais malditos da nossa música.

Seja bem vindo ao blog Cada Lugar Na Sua Coisa: O blog dos Malditos


Cada um na Sua Coisa: A bela música de Sérgio Sampaio que dá titulo ao nosso blog. "Lugar de poesia é na calçada"